A Lava Jato também pegará o Judiciário, diz ex-ministra do STJ

Publiciado em 16/04/2017 as 13:38

"A Lava Jato pegará o Poder Judiciário num segundo momento. O Judiciário está sendo preservado, como estratégia para não enfraquecer a investigação." A previsão é de Eliana Calmon, ministra aposentada do Superior Tribunal de Justiça, ex-corregedora nacional de Justiça. "Muita coisa virá à tona", diz. Ela foi alvo de duras críticas ao afirmar, em 2011, que havia bandidos escondidos atrás da toga. "Os políticos corruptos nunca temeram a Justiça e o Ministério Público. O que eles temem é a opinião pública e a mídia", afirma.

Pergunta - Como a senhora avalia a lista dos investigados a partir das delações?
Eliana Calmon - Não fiquei surpresa. Praticamente todos os grandes políticos estariam envolvidos, em razão do sistema político brasileiro, que está apodrecido.

Algum nome incluído na lista a surpreendeu?
Calmon - José Serra (PSDB-SP) e Aloysio Nunes Ferreira (ministro das Relações Exteriores, também do PSDB-SP).

A Lava Jato poderá alcançar membros do Poder Judiciário?
Calmon - No meu entendimento, a Lava Jato tomou uma posição política. É minha opinião pessoal. Ou seja, pegou o Executivo, o Legislativo e o poder econômico, preservando o Judiciário, para não enfraquecer esse Poder. Entendo que a Lava Jato pegará o Judiciário, mas só numa fase posterior, porque muita coisa virá à tona.

Os tribunais superiores têm condições de instaurar e concluir todos esses inquéritos?
Calmon - É possível o Poder Judiciário punir a corrupção com vontade política. É difícil, porque tudo depende de colegiado. Muitas vezes alguém pede vista e "perde de vista", não devolve o processo. Hoje, o Judiciário está convicto de que precisa funcionar para punir.

Como deverá ser a atuação do Judiciário nos Estados com os acusados sem foro especial?
Calmon - Hoje, o Judiciário mudou inteiramente. Todo mundo quer acompanhar o sucesso de Sergio Moro. Os ventos começam a soprar do outro lado.

Como avalia o desempenho da presidente do STF, ministra Cármen Lúcia?
Calmon - A ministra Cármen Lúcia demonstra grande vontade. Mas vai precisar de muito jogo de cintura. O colegiado é muito complicado, muito ensimesmado. Os ministros são muito poderosos. Há muita vaidade.

Há risco de um "acordão" para sobrevivência política dos investigados?
Calmon - O Congresso Nacional já está tomando as providências para que não haja a punição deles próprios. Eles estão com a faca e o queijo na mão. É óbvio que haverá uma solução política para livrá-los, pelo menos, do pior.

Como vê a crítica de que a lista criminaliza os partidos e a atividade política?
Calmon - É uma forma de inibir a atividade do Ministério Público e da Justiça. Os políticos corruptos nunca temeram a Justiça. O que eles temem é a opinião pública e a mídia.

A Lava Jato cometeu excessos?
Calmon - Houve alguns excessos, porque o âmbito de atuação foi muito grande.

A senhora foi citada numa das delações por ter recebido da Odebrecht para sua campanha a senadora, em 2014.
Calmon - Foi R$ 200 mil ou R$ 300 mil, não me lembro. Não foi mais do que isso. Mas não foi doação a Eliana Calmon, foi ao partido, ao PSB, que repassou para mim. Esse dinheiro está na minha declaração.

Essa contribuição não compromete o seu discurso?
Calmon - Não, em nada. Inclusive, depois da eleição, um dos empregados graduados da Odebrecht perguntou se eu poderia gravar uma entrevista. Os advogados pediam a pessoas com credibilidade para dar um depoimento a favor da Odebrecht, por tudo que a empresa estava sofrendo. Não fiz a gravação. Porque isso desmancharia tudo que fiz como juíza. Sempre agi como Sergio Moro.

* Folhapress