Especialista em Direito analisa os impactos do marco legal de Jogos eletrônicos no Brasil

O projeto de lei brasileiro se inspira em modelos de outros países, mas leva em conta as particularidades do mercado brasileiro e do perfil dos seus consumidores

Publiciado em 19/04/2024 as 13:00
Divulgação/ Unit

O setor de jogos eletrônicos tem experimentado um crescimento notável a cada ano, alcançando níveis inéditos de popularidade e influência cultural. Contudo, esse avanço traz consigo uma série de preocupações relacionadas à segurança jurídica, classificação indicativa, benefícios fiscais e proteção da juventude.

Nesse contexto, surge o Projeto de Lei nº 2.796/2021, que propõe uma legislação específica para os jogos eletrônicos no Brasil, abordando diversas questões que afetam tanto a indústria quanto os consumidores. Esse projeto agora aguarda a sanção presidencial. Se aprovado, representará um marco significativo na trajetória dos jogos eletrônicos no Brasil.

O procurador do Trabalho e professor de Direito na Universidade Tiradentes (Unit), Ricardo Carneiro, enfatiza a importância desse marco legal para a indústria nacional de jogos. "A principal contribuição de um marco legal é proporcionar segurança jurídica, o que, a longo prazo, resultará no crescimento sustentável da indústria de jogos e de toda a sua cadeia produtiva", destaca Carneiro.

Além disso, o projeto reconhece formalmente profissões específicas, como designers de jogos e narradores de jogos eletrônicos, permitindo que esses profissionais sejam contratados legalmente e contribuam para o avanço do setor. "A regulamentação dessas profissões possibilitará às empresas contratar novos talentos com registro formal, o que certamente gerará mais empregos em um campo tão desejado, especialmente pelos jovens", acrescenta.

Impostos e incentivos fiscais

Um dos pontos centrais do projeto de lei é a concessão de incentivos fiscais semelhantes aos aplicados ao setor cultural, conforme estipulado na Lei Rouanet e na Lei do Audiovisual. "O projeto traz excelentes oportunidades para empresários que já atuam no setor e para aqueles que desejam ingressar ou expandir seus negócios nessa área em crescimento. Destacam-se, entre outros aspectos, a inclusão de um artigo na Lei do Audiovisual, Lei 8685/1993, que oferece um abatimento de 70% no Imposto de Renda devido em remessas ao exterior relacionadas à exploração de jogos eletrônicos ou licenciamentos", explica Carneiro.

Este benefício também será estendido aos contribuintes que investirem no desenvolvimento de projetos de jogos eletrônicos independentes no Brasil. Além disso, o projeto prevê tratamento tributário especial para promover o desenvolvimento de jogos por empresários individuais, sociedades empresariais, cooperativas, sociedades simples e microempreendedores individuais (MEI).

"Isso pode impulsionar significativamente o setor, incentivando investimentos em tecnologia e produção audiovisual relacionada aos jogos eletrônicos. O marco legal reconhece também o potencial dos jogos eletrônicos para além do entretenimento, abrindo portas para sua utilização em áreas como educação e terapia", destaca Carneiro.

Outro ponto relevante é a definição de jogos eletrônicos. O texto aprovado exclui categoricamente os jogos de azar eletrônicos, como "bet", "poker", entre outros que envolvam premiações em dinheiro. "Além disso, o projeto estabelece que, para a concepção, design, gestão e funcionamento dos jogos eletrônicos destinados a crianças e adolescentes, devem ser adotadas medidas adequadas e proporcionais para mitigar os riscos aos seus direitos", ressalta.

Para além do entretenimento

Com a aprovação do marco legal, a indústria brasileira de jogos eletrônicos vislumbra um horizonte promissor. "O novo arcabouço jurídico proporcionará segurança jurídica, elemento fundamental para o desenvolvimento de qualquer setor. Além disso, ao buscar aumentar a disponibilidade de capital para investimentos na indústria de jogos e estimular pesquisas científicas e tecnológicas no setor, o projeto prevê incentivos especiais para o desenvolvimento de jogos por empresários individuais, cooperativas, sociedades simples e empresariais, e até mesmo por microempreendedores individuais", observa Carneiro.

O marco legal dialoga com outras legislações vigentes, como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), reforçando a proteção dos mais jovens. "Os fornecedores de jogos eletrônicos têm a responsabilidade de proteger as crianças e adolescentes contra exposição a conteúdos violentos ou abusivos (por exemplo, os que promovem discriminação). Ademais, devem ser estabelecidos canais de reclamações e denúncias de tais abusos. As ferramentas de compra também devem buscar o consentimento dos responsáveis pelos usuários jovens", orienta.

Conforme o projeto, caberá ao Estado classificar os jogos por faixa etária, levando em conta os riscos associados ao uso de microtransações (compras digitais dentro do jogo), que podem incentivar o consumo excessivo por parte das crianças. "Da mesma forma, essas ferramentas de compra devem, por padrão, restringir a realização de compras e transações comerciais por crianças, garantindo o consentimento dos responsáveis", acrescenta Carneiro.

O projeto de lei brasileiro se inspira em modelos de outros países, mas considera as especificidades do mercado nacional e o perfil dos seus consumidores. "Nosso modelo não se distancia muito do que é adotado em outros países. É verdade que alguns estão talvez mais avançados do que o Brasil. Por exemplo, o Canadá inclui os jogos como ativos culturais, o que leva os órgãos públicos a contemplarem os jogos em seus editais nas mais diversas áreas. É possível que cheguemos a um estágio semelhante no futuro. No entanto, por enquanto, nossa legislação já representa um grande avanço", projeta Carneiro.

Por: Laís Marques

Fonte: Asscom Unit